ARTE,AMOR E FÉ NO JAPÃO PÓS-GUERRA

Esta semana, anunciaram a morte do escritor japonês Kenzaburo Oe (1935), ganhador do Nobel que eu aprendi a admirar quando comecei a ler traduções em inglês de autores asiáticos. Motivo: achei os textos mais fáceis de entender em inglês. Virou mania.

Sua editora, Kodansha, anunciou a morte na segunda-feira. Não especificou uma causa ou disse onde Havia morrido. Ele tinha 88 anos.

Eu conheci recentemente o sr. Oe embora tenha lido o primeiro livro em que se destacou, quando era ainda estudante na Universidade de Tóquio no final dos anos 1950 e ganhou um importante prêmio literário de contos.

Embora ele sempre dissesse que escrevia pensando apenas no público japonês, a partir dos anos 1960, sr. Oe atraiu leitores internacionais.

É célebre por três obras em particular: “Hiroshima Notes”, uma coleção de ensaios sobre as consequências de longo prazo dos ataques com bombas atômicas; e os romances “A Personal Matter” e “The Silent Cry”, que tiveram sua gênese em uma crise para ele e sua esposa, o nascimento de um filho com o crânio deformado.

ORIGEM

O sr. Oe, um prodígio de uma remota aldeia na floresta na ilha ocidental de Shikoku, tornou-se o jovem escritor japonês mais importante de seu tempo. Mas, por volta dos 20 anos, ele estava profundamente deprimido, pensando em suicídio, porque não via nenhum caminho a seguir em sua escrita.

Então, em 1963, ocorreu uma confluência de eventos que mudariam sua vida. Em junho daquele ano, seu primeiro filho nasceu com uma grande massa saindo de uma lesão no crânio. Sem cirurgia, disseram os médicos, o menino morreria. Com a cirurgia, ele teria graves deficiências mentais.

A princípio, o sr. Oe só queria fugir, e fugiu. Enquanto o bebê de uma semana estava internado em um hospital, ele aceitou um trabalho jornalístico para cobrir uma conferência antinuclear internacional em Hiroshima.

Em uma entrevista concedida em 1995 à revista New Yorker, ele disse: “Eu estava fugindo do meu bebê. Foram dias vergonhosos para eu lembrar. Eu queria fugir para algum outro horizonte.”

O sr. Oe começou a entrevistar os sobreviventes da explosão 18 anos antes e começou a ganhar coragem com o exemplo deles. Eles não queriam ser “um conjunto de dados de vítimas”, como escreveu na introdução de “Hiroshima Notes”. Eles queriam viver suas vidas como indivíduos livres. Ele conheceu mulheres que escolheram ter filhos independentemente do risco de as crianças desenvolverem leucemia e morrerem, e encontrou muitos heróis tranquilos que, escreveu, “não cometeram suicídio apesar de tudo”.

Ele foi especialmente influenciado pelo dr. Fumio Shigeto, diretor de um hospital de bombas atômicas de Hiroshima e ele próprio um sobrevivente, que se tornou um dos primeiros a entender a doença da radiação. Na entrevista ao The New Yorker, o Sr. Oe relembrou uma história que o dr. Shigeto lhe contou sobre um jovem médico que se desesperava em ser útil contra um sofrimento tão avassalador. O médico disse que respondeu: “Se houver pessoas feridas, se estiverem com dor, devemos fazer algo por elas, tentar curá-las, mesmo que pareça que não temos método”.

Ao ouvir isso, o sr. Oe disse: “Senti uma grande vergonha por não estar fazendo nada por meu filho – meu filho, que estava calado e não conseguia expressar sua dor ou fazer qualquer coisa por si mesmo”.

Ele voltou para Tóquio e escolheu a cirurgia para a criança, que se chamava Hikari – japonês para “luz”.  Hikari sobreviveu, embora precisasse de cuidados perpétuos e não progredisse além do nível de uma criança de 3 anos em muitos aspectos, disseram os médicos.

AMOR ESPECIAL

Quando Hikari completou 6 anos, algo extraordinário aconteceu. Durante um passeio com seus pais, Hikari ouviu o canto de um pássaro e imediatamente o identificou. Seus pais ficaram tão maravilhados, que resolveram comprar uma porção de CDs com cantos de pássaros e também contrataram uma professora de piano para que Hikari pudesse se expressar através da música.

Em vez de falar, Hikari começou a expressar seus sentimentos através das suas composições musicais. Sim, aquele que os médicos disseram que seria um “vegetal” para o resto da sua vida, tornou-se um músico e compositor conceituadíssimo no Japão. Seu primeiro CD vendeu mais de um milhão de cópias nos primeiros anos de lançamento. Embora esteja em francês, este vídeo mostra o trabalho de Hikari e seus pais.

Vale também a pena conhecer a música de Hikari Oe.

3 comentários em “ARTE,AMOR E FÉ NO JAPÃO PÓS-GUERRA”

  1. Oi Cris, que linda a história do sr. Oe e de seu filho Hikari. Emocionante. Obrigada por compartilhar. Bjs.
    P. S. Amanhã, dia 19 de março faz 66 anos que viemos morar no Condomínio Edificio São Vicente. Haja história por aqui. Bjs

    Enviado do meu iPhone

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